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Aranhas, palhaços ou alturas. Como tratar uma fobia?

11 Fev 2024 - 08:44

Aranhas, palhaços ou alturas. Como tratar uma fobia?

A água do mar, um quarto escuro, aranhas, palhaços ou agulhas. Qualquer objeto, ser vivo ou ambiente podem desencadear uma sensação de pânico em determinadas pessoas. Mas o que é uma fobia? O que a distingue do medo? E como tratar?

Em declarações ao Viral, João Palha, psiquiatra e diretor clínico da Casa de Saúde Santa Catarina (CSSC) e Maria João Silva, psicóloga clínica da Ordem dos Psicólogos Portugueses, respondem a todas as questões.

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O que é uma fobia?

João Palha começa por adiantar que “a fobia é uma perturbação de ansiedade” caracterizada por “um medo intenso e irracional de qualquer coisa”, seja “um objeto, uma situação, um animal, uma atividade ou um ambiente”.

Segundo Maria João Silva, tanto as crianças, como os adultos, podem desenvolver fobias. E existem algumas mais comuns do que outras. A psicóloga fala, por exemplo, da “aracnofobia” (fobia de aranhas) que, até à data e com registo, “é a mais prevalente nos adultos”.

Por que razão algumas fobias são mais comuns? Na perspetiva de João Palha, isto deve-se ao facto de essas fobias estarem associadas a objetos, animais ou situações habituais do dia a dia. 

O psiquiatra dá o exemplo da “agorafobia”, “o medo intenso e irracional de algum local de que é difícil de escapar ou de pedir ajudar”. Como explica João Palha, “qualquer lugar alto pode desencadear agorafobia”.

Além disso, fobias a “cães” e “aranhas” também são comuns, por serem animais que estão presentes, com frequência, no quotidiano das pessoas.

Segundo os especialistas consultados pelo Viral, os sintomas associados a esta perturbação só se manifestam no momento de contacto com o objeto de fobia, ou no momento em que a pessoa percebe que vai estar nessa situação.

A fobia “é uma ansiedade muito extrema” e é isso, sobretudo, “que a distingue do medo mais normativo”, explica Maria João Silva.

Em termos objetivos, salienta João Palha, uma crise fóbica “é quase como se fosse um ataque de pânico”. A diferença entre um ataque de pânico comum e a manifestação da fobia “é que a fobia tem um motivo e o ataque de pânico, por definição, não tem causa”. 

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Maria João Silva refere que, tal como acontece no ataque de pânico, “há uma componente fisiológica muito exacerbada, através do batimento cardíaco muito acelerado, de hiperventilação e, às vezes, sudação”.

Além disso, “o evitamento” também é uma caraterística fundamental das fobias. Quando a pessoa sabe que alguma coisa lhe provoca esse medo excessivo, “evita ser confrontada com isso”, acrescenta a psicóloga.

Por exemplo, refere, “alguém com uma fobia a cães sabe que um determinado amigo tem um cão, e, por isso, deixa de frequentar a casa do amigo”.

A esse “evitamento” constante junta-se “a fuga expressiva, quando a pessoa é confrontada com esse medo”, conclui.

As fobias têm sempre uma causa?

“Como qualquer perturbação de ansiedade, as causas das fobias são multifatoriais”, adianta Maria João Silva. Por norma, frisa a psicóloga, “há um fator desencadeador”, isto é, alguma situação “que pode ter acontecido com o próprio (ou não)”.

Depois, pode haver “uma interação desses fatores ambientais com fatores genéticos e com o tipo de personalidade” da pessoa. 

Maria João Silva dá um exemplo: “Acompanhei uma menina que tinha uma fobia a cães. Ela nunca tinha sido mordida, mas o irmão sim. Essa informação interagiu com vulnerabilidade genética para a ansiedade, que ela já tinha, e com o seu temperamento mais introvertido e evitante (típico de quem desenvolve perturbações de ansiedade)”.

No entanto, aponta a psicóloga, “curiosamente, as fobias são as perturbações que menos dependem” dessa interação, ou seja, “são mais condicionadas por essas tais experiências do meio”.

Todas as fobias têm o mesmo impacto na vida de uma pessoa?

Na visão dos especialistas, existem fobias com um maior impacto na vida das pessoas do que outras. Maria João Silva dá o exemplo das fobias médicas relacionadas com agulhas ou com idas ao dentista que, salienta, “são fobias muito condicionantes”.

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Para mais, João Palha refere a “fobia social”, que “pode ser muito limitadora” e ter um impacto relevante, sobretudo em determinadas fases da vida.

Por outro lado, frisa Maria João Silva, há fobias “associadas ao meio natural – como alturas, catástrofes naturais, tempestades ou trovoadas – e situacionais – como aviões, pontes e elevadores” -, que podem não ter uma presença tão evidente na vida do doente.

Como se trata uma fobia?

Maria João Silva começa por destacar que, “quando a fobia é intensa, é importante não esperar, do ponto de vista terapêutico”. Na perspetiva da psicóloga, “quanto mais cedo se procurar ajuda, melhor”. 

No que diz respeito ao tratamento, segundo os especialistas, por norma, consiste na psicoterapia cognitivo-comportamental. “No fundo, a pessoa tem de identificar esses pensamentos irracionais e arranjar estratégias para mudar esses padrões de pensamento e de comportamento”, esclarece João Palha. 

Em termos práticos, explica Maria João Silva, “o que se faz é ajudar o paciente a expor-se ao elemento fóbico ou à situação fóbica”. 

Em primeiro lugar, ensinam-se “estratégias de relaxamento” que vão permitir “gerir a ansiedade de uma forma mais eficiente”, no momento da exposição.

De seguida, “constrói-se uma exposição hierárquica” à fobia. “Se a pessoa tem medo de aviões, pode-se começar por mostrar imagens de aviões, depois vídeos” e, numa fase mais avançada, “fazer-se uma aproximação ao aeroporto para a pessoa ver o avião no chão”, exemplifica a psicóloga.

Ao longo destas “tarefas construídas, em que o paciente vai sendo gradualmente exposto ao medo”, é feita “uma gestão da ansiedade e da ativação fisiológica”, prossegue.

Este acompanhamento “ajuda a pessoa a racionalizar” o medo, ou seja, “com a exposição, a mente vai percebendo, aos poucos, que a situação não é efetivamente perigosa”, permitindo, numa última fase, “que a pessoa viva a experiência sem fugir dela”, sustenta.

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Aliás, nesse sentido, João Palha refere que está a ser desenvolvido um projeto, na Casa de Saúde Santa Catarina, ligado à realidade virtual nas fobias”. Segundo o psiquiatra, o objetivo é que “algumas sessões de realidade virtual” sejam incluídas “no tratamento global de psicoterapia”.

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Na perspetiva do médico, esta abordagem é benéfica, sobretudo em fobias como a acrofobia (fobia de alturas). Neste caso, para haver exposição ao medo intenso, seria necessário a pessoa ir para um edifício muito alto, por exemplo.

“Com a realidade virtual, é possível simular isso e trabalhar com dados biológicos interessantes”, esclarece. “Pode-se ver a frequência cardíaca, a frequência respiratória e outros sinais indiretos de ansiedade”, que podem ser geridos com maior facilidade.

Noutro plano, em termos de medicação, acrescenta João Palha, “numa situação aguda pode-se recomendar que a pessoa tome um calmante”. Além disso, se, de facto, “a fobia for bastante comprometedora do funcionamento global da pessoa, pode ser feito um tratamento genérico para a ansiedade”, em que se inclui a toma de antidepressivos.

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Saúde mental

11 Fev 2024 - 08:44

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